Início do Curso e o conceito de “Viralatas”

Em que momento se terá iniciado a saga dos Viralatas, Curso de Pilotagem P1/69?

Antes de mais, foi preciso determinar o que são os Viralatas! Pois bem, esse conceito foi bem cedo definido, nos primórdios de São Jacinto, quando nele foram incluídos todos aqueles que iniciaram o Curso, bem como aqueles que a ele se juntaram até ao seu final.

Sendo momentos colectivos, duas datas poderiam ser referência comum aos Viralatas:

– 11 de Maio de 1968, primeiro dia da publicação do anúncio de recrutamento de mancebos voluntários com destino aos cursos de pilotagem, pelo Centro de Recrutamento e Mobilização nº 1, da Força Aérea.
– 6 de Janeiro de 1969, aquele em que a maioria dos mancebos aprovados se apresentou na Base Aérea 7, em São Jacinto, para início do Curso.

Foram estes os “Viralatas”, aqueles que sobreviveram (apenas cerca de 10% dos candidatos iniciais) aos  filtros da Força Aérea (documental na Rua Newton, nº 6, R/C,   médico e psicotécnico na Avenida da Liberdade, nº 240).

Fará então todo o sentido que se considere Dia dos Viralatas o dia 6 de Janeiro de 1969.

Inverno/Primavera de 1968/69

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O curso era heterogéneo (felizmente ainda o é), com alunos das mais variadas origens sociais e culturais. Foi preciso enquadrar o grupo numa, para quase todos, desconhecida componente militar, para o que muito contribuíram alguns alunos com experiência anterior do Colégio e da Academia Militar (Carpinteiro, Santana e Baía, mais tarde o Lima furriel pára-comando).

A rigidez instrutória do profissional pára-quedista Sargento Branco foi temperada pela capacidade comunicativa do Alferes Pegado. Controlado, nunca o grupo deixou de resistir às praxes estúpidas, e sempre demonstrou um forte carácter, tanto na solidariedade e no apoio aos que precisavam de apoio na difícil instrução, como na luta contra os infortúnios que levaram, infelizmente, ao desaparecimento de uns, e ao abandono de alguns mais.

Por outro lado, o corpo de instrutores continha também diferenças assinaláveis entre instrutores, reflexo normal do “modus operandi” da Instrução. Alguns deles, independentemente das qualidades de pilotagem e pessoais, denotavam falta de sensibilidade e capacidade pedagógica, deixando ao aluno a “obrigatoriedade” de se adaptar ao instrutor, numa luta desigual agravada para aqueles que iniciaram o curso no T-6.

Curiosamente, foi o P1/69 “cobaia” para três experiências:

 a) decisão de, pela primeira vez, ( e bem, a meu ver) os alunos pilotos fazerem uma recruta “a sério”, com exigente componente física e militar, incluindo ordem unida, com papel preponderante do Sargento páraquedista Branco e do Alferes César Pegado, com coordenação geral do Capitão Perestrello;

 b) tendo iniciado a recruta com uso de farda cinzenta (“pelo de rato”), foi o primeiro grupo da Força Aérea a usar, em Abril de 69, a farda azul, generalizada no mês seguinte;

 c) dada a premência de formação de pilotos, foi superiormente decidido que uma das duas turmas começasse a pilotagem básica, pela 1ª vez,  pelo T-6, avião bem mais difícil que a solução até então adoptada (Chipmunk). Essa opção revelou-se desastrosa para o grupo, já que a percentagem de eliminados no T-6 foi muitíssimo superior à da turma iniciada no Chipmunk!

Os esboços e o significado do emblema “Viralatas”, a curta vida do primeiro Viralata

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Em boa verdade, o nosso emblema é ideia e iniciativa de um só Viralata, o Pedro Rodrigues, talvez o mais sonhador, tão cedo se imaginou a voar quer no autogiro que o pai construía, quer nos planadores e aviões da Mocidade Portuguesa, no Chip ou nos helis, sonho alimentado pelos largos horizontes dos planaltos de Angola onde cresceu. A sequência de esboços do emblema que antecederam a versão final é bem demonstrativa da força do seu sonho, e por isso foi fácil aos Viralatas acolherem as razões de escolha tão acertada: o avião é uma lata, o Pluto/Pateta é um viralata e o aviador, pilotando, “vira a lata” que é o avião. Tão simples!

Foi largado no Chipmunk em São Jacinto em Julho 69, trazendo a experiência e o à vontade dos planadores e das “avionetas” da Mocidade.

No dia seguinte, no Chip 1313, quase descolava com um estabilizador todo rasgado numa bailarina do taxiway para a 35 (e eu, seguindo atrás dele na rolagem, numa aflição, a querer transmitir-lhe que não podia descolar assim, e a não poder “entrar” na frequência congestionada… Já levantava a roda de cauda quando a torre o mandou abortar … Uff!!)

A turma do Chipmunk tinha meia dúzia de horas no T-6 (andávamos a fazer perdas e “vrilles”) quando fomos para os helis em Tancos. O Pedro e o Zé Manel Soares da Fonseca foram parar ao tem. Brogueira, formavam um grupo bem disposto e animado, penso que tinham os três muitas parecenças temperamentais. Passámos o Outono e o Inverno desse ano num curso alegre e bem aproveitado, com muito bons instrutores, desde o Custódio Santana ao Ferreira Pinto,  do Pereira ao Gamboa e ao Brogueira, não esquecendo o magnífico Nazaré!

Voluntariou-se depois do brevetamento, em Maio de 70, para Angola. No final da comissão, passou a voar na CTA, e é no Leste, na pista de Nova Chaves que cai, num acidente com estranhos contornos e coincidências, como o de transportar presos no fatídico voo. Terá sido o primeiro com o sonho Viralata, foi também o primeiro a desaparecer em acidente de avião.

A instalação e a adaptação a uma nova realidade

Em boa verdade, ao apresentar-se em São Jacinto, esta magnífica matilha ainda não se apercebera da sua formidável identidade colectiva, naqueles dias éramos um inseguro grupo de mancebos sujeitos a novas regras impostas pela estrutura militar e um desconhecido tipo de praxes aplicadas por uma “elite de senhores alunos pilotos” já instalada há alguns meses na BA 7 – nada mais que o curso anterior, o P2/68, os “Passarões”.

A grande maioria ultrapassara, isoladamente ou em pequenos grupos, por uma terrível prova de acesso ao curso: refiro-me ao dia em que, algures entre Outubro e Dezembro de 1968, munido de uma guia de marcha, cada um se foi apresentar na Secretaria da Base. O olhar aquilino dos “Passarões” do curso anterior P2/68, já em fase de voo, detectou os imberbes mancebos, desde logo apelidados de “infras abaixo de cão” e submetidos a fortíssimas praxes que mais severas pareciam pela desproporção entre o grupo de dezenas de “senhores alunos” e o isolamento do mancebo, que galhardamente aguentou a primeira tempestade do curso, absolutamente inédita para quase todos. Este tema (praxes) será desenvolvido mais detalhadamente num outro capítulo. 

Na verdade, cada um sonhava apenas em ser piloto, a esmagadora maioria nunca se sentara num avião, e o grupo vê-se confrontado com o choque de, pela primeira vez, um curso de pilotagem de milicianos sofrer as agruras de um treino militar cujas componentes física e disciplinar não eram pêra doce!! Apesar de alguns exageros, o grupo, bem enquadrado por alguns rafeiros com experiência militar anterior, adaptou-se bem e teve óptimo comportamento, tal como aguentou estoicamente as praxes, cujas virtudes dependiam quase exclusivamente da competência do praxador…

Instalados numa enorme camarata, bem próxima do pontão das lanchas da Marinha que faziam a ligação a Aveiro, nela conviviam os Passarões e os Viralatas, em duas fiadas de camas duplas em beliche, separadas por armários metálicos, também existentes em fiadas na parte central da camarata. No edifício da camarata, a seguir à porta de entrada, existiam as acasas de banho à esquerda e à direita, uma antecâmara que precedia a porta da comprida camarata, que albergava mais de oitenta alunos pilotos (à época cerca de cinquenta Viralatas e cerca de trinta Passarões), em permanente mudança, com precoces saídas e novas entradas.

O começo do sonho, a fase de recrutamento

Com a Força Aérea a necessitar de complementar os seus quadros com pilotos milicianos voluntários para a guerra no Ultramar, Na década de 60 começou a ser comum a formação de pilotos em dois e três cursos anuais, ao mesmo tempo que corriam os cursos de pilotos para o quadro permanente. Normalmente, o avião de instrução básico era o Chipmunk, seguido pelo T-6 ou helicópteros AL II e/ou Al III, enquanto os oficiais do quadro permanente faziam o curso também em T-37 e Fiat G-91. No palco ultramarino, voavam o Fiat G-91, o T-6, o DO-27, o Al III, mais tarde o Puma SA-330, para além do velhinho Dakota DC-3 e do NordAtlas, com aparições mais ou menos fugazes de outros aviões da “pesada”, desde os DC-4 e DC-6 aos B-26, e já na década de 70, os Boeing 707, de transporte de e para a Metrópole.

É com base nesta necessidade de formação que surge em Maio de 1968 (contemporâneo do movimento estudantil em França) o anúncio que leva cerca de quinhentos candidatos a voluntariar-se ao curso de pilotagem, cuja selecção nas instalações da FAP na Av. Da Liberdade, 240, em Lisboa, apurou apenas cerca de dez por cento do total, com guia de marcha para se apresentarem na BA 7, em São Jacinto,  no Outono de 1968, entrando logo de seguida de licença registada até ao início do curso em Janeiro de 1969.

Os exames médicos e psicotécnicos aos mancebos voluntários decorreram no final do Verão de 68, numa selecção rigorosa e muito exigente, num ambiente desconhecido para muitos dos candidatos, sendo que a maioria nem conhecia Lisboa, ficando quase todos instalados na BA 1 em Sintra, usando as camionetas da Força Aérea para o transporte diário. E assim, entre exames médicos e as sessões de psicotécnicos , incluindo as entrevistas com o Dr. Cabral de Sá, se passaram algumas semanas até à decisão final da desejada aptidão para o Curso de Pilotagem. Nestas semanas de convivência se cimentaram as bases do futuro Espírito Viralata, desenvolvido e apurado nas camaratas, nos exercícios de instrução militar, nas salas de briefing, enfrentando as praxes, a rígida disciplina militar e as dificuldades das aulas de voo que se seguiram.

Início do Curso e o conceito de “Viralatas”

Em que momento se terá iniciado a saga dos Viralatas, Curso de Pilotagem P1/69?

Antes de mais, foi preciso determinar o que são os Viralatas! Pois bem, esse conceito foi bem cedo definido, nos primórdios de São Jacinto, quando nele foram incluídos todos aqueles que iniciaram o Curso, bem como aqueles que a ele se juntaram até ao seu final.

Sendo momentos colectivos, duas datas poderiam ser referência comum aos Viralatas:

  • – 11 de Maio de 1968, primeiro dia da publicação do anúncio de recrutamento de mancebos voluntários com destino aos cursos de pilotagem, pelo Centro de Recrutamento e Mobilização nº 1, da Força Aérea.
  • – 6 de Janeiro de 1969, aquele em que a maioria dos mancebos aprovados se apresentou na Base Aérea 7, em São Jacinto, para início do Curso.

Foram estes os “Viralatas”, aqueles que sobreviveram (apenas cerca de 10% dos candidatos iniciais) aos  filtros da Força Aérea (documental na Rua Newton, nº 6, R/C,   médico e psicotécnico na Avenida da Liberdade, nº 240).

Fará então todo o sentido que se considere Dia dos Viralatas o dia 6 de Janeiro de 1969.